quinta-feira, 6 de setembro de 2012

PERGUNTAS FUNDAMENTAIS AO LONGO DO MINISTÉRIO


PERGUNTAS FUNDAMENTAIS AO LONGO DO MINISTÉRIO

Eu tenho pensado muito sobre o ministério e tenho analisado muito sobre a caminhada ministerial, depois de muitas observações e inquietações, concluí que um bom ministro de Cristo deve sempre ser prudente e vigilante ao longo de toda sua caminhada ministerial.
Existem muitos ministros que acabaram se desviando ao longo do exercício ministerial e existem muitos que acabaram se esfriando e permitindo que outras coisas dominem o coração e o ministério. Alguns já começam de forma errada, mas existem outros que começam bem e acabam se corrompendo durante a caminhada. Quando um ministro se corrompe nem sempre ele mesmo se dá conta do acontecido, muitas vezes outras pessoas é que notam primeiro. Em alguns outros casos, o ministro se corrompe, ele mesmo sabe, mas ninguém mais se apercebe disso, ele continua mantendo a sua posição diante das pessoas e continua fazendo tudo como se ainda tivesse o mesmo coração ou as mesmas motivações.
Por causa desta necessidade de estarmos sempre vigilantes sobre a maneira como estamos servindo a Deus, formulei algumas perguntas que um bom ministro deve sempre fazer-se, eis aqui algumas delas:

  • ·        Será que ainda continuo servindo verdadeiramente a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo tendo motivações bíblicas?
  • ·        Será que ainda continuo pregando o verdadeiro evangelho?
  • ·        Será que ainda continuo tendo intimidade com Deus?
  • ·        Será que ainda continuo amando verdadeiramente a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo seguindo a direção de Deus.
  • ·        Será que ainda continuo ouvindo a voz do Espírito Santo?
  • ·        Será que ainda tenho a bênção de Deus sobre mim?
  • ·        Será que ainda tenho a aprovação de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo buscando a glória de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo sendo um instrumento de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo usando os métodos de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo tendo os sentimentos de Cristo?
  • ·        Será que ainda continuo na visão que recebi de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo cumprindo a missão que recebi de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo temendo a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo obedecendo a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo agradando a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo no caminho certo?
  • ·        Será que ainda continuo confiando em Deus?
  • ·        Será que ainda continuo crendo nas promessas de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo colocando Deus em primeiro lugar?
  • ·        Será que ainda continuo tendo um coração sedento por Deus?
  • ·        Será que ainda continuo tendo Deus como o detentor o trono do meu coração?
  • ·        Será que ainda continuo buscando a Deus?
  • ·        Será que ainda continuo sendo cristão diante de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo sendo adorador diante de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo sendo servo diante de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo sendo humilde diante de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo amando a Palavra de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo amando a oração?
  • ·        Será que ainda continuo amando a presença de Deus?
  • ·        Será que ainda continuo amando o meu próximo?
  • ·        Será que ainda tenho o meu coração puro diante de Deus?



segunda-feira, 3 de setembro de 2012


o povo que conhece
seu Deus

Eu passeava ao sol com um professor que havia perdido efetivamente suas possibilidades de avanço na carreira acadêmica, por ter entrado em choque com os dignitários da Igreja a respeito do evangelho da graça. "Mas isso não tem importância", afirmou, "pois eu conheci a Deus, e eles não". Essa declaração foi um mero parêntese, um comentário a respeito de algo que eu tinha dito, mas que me ficou gravado na mente e me fez pensar.
Não creio que muitos de nós possamos dizer com espontaneidade que conhecemos a Deus. Essas palavras implicam uma experiência definitiva e verdadeira, à qual, se formos sinceros, temos de admitir que somos ainda estranhos. Afirmamos isso talvez para dar testemunho e poder contar a história de nossa conversão como o melhor deles: dizemos que conhecemos a Deus — isto, afinal de contas, é o que se espera que os evangélicos digam. No entanto, será que nos ocorreria dizer, sem hesitação, e em referência a acontecimentos particulares de nossa história pessoal, que realmente conhecemos a Deus? Duvido, pois suspeito de que para a maioria de nós a experiência de Deus jamais foi assim tão vivida.
Penso que muitos de nós nem poderíamos dizer com naturalidade que as decepções do passado e as tristezas do presente, como as vê o mundo, são irrelevantes quando comparadas ao conhecimento de Deus que viemos a alcançar. A realidade, porém, é que para muitos de nós elas têm significado real, são nossas "cruzes" (como as chamamos). Ficamos constantemente entristecidos, amargurados e apáticos quando nos lembramos delas, o que fazemos com freqüência. A atitude que mostramos ao mundo é um tipo de estoicismo frio, a quilômetros de distância da alegria "indizível e gloriosa" que Pedro confiava estarem sentindo todos seus leitores (lPe 1:8). "Pobres almas", nossos amigos dizem a nosso respeito, "como têm sofrido" — e é justamente isso o que sentimos!
Essa tendência para fazer o papel de mártir, porém, não tem lugar na mente de quem conhece a Deus de fato. Eles nunca se preocupam com o que poderia ter sido; nunca pensam nas coisas que perderam, apenas nos ganhos. "Mas o que para mim era lucro, passei a considerar como perda, por causa de Cristo", escreveu Paulo. "Mais do que isso, considero tudo como perda, comparado com a suprema grandeza do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor, por quem perdi todas as coisas. Eu as considero como esterco para poder ganhar a Cristo e ser encontrado nele [...] Quero conhecer Cristo [...]" (Fp 3:7-10).
Quando Paulo diz que considera "esterco" tudo o que perdeu, não só afirma que não dá nenhum valor a essas coisas, mas que tampouco permanecem constantemente em seus pensamentos. Que pessoa normal passa seu tempo sonhando nostalgicamente com esterco? Entretanto, é o que na realidade muitos de nós fazemos, e isso mostra como temos pouco conhecimento de Deus.

Conhecimento retórico versus conhecimento real
É necessário fazer uma auto-análise sincera neste ponto. Somos, talvez, evangélicos ortodoxos. Podemos explicar o evangelho com clareza e podemos sentir o cheiro de doutrina falsa a quilômetros de distância. Se alguém nos perguntar como os homens podem conhecer a Deus, de imediato apresentamos a fórmula certa: que chegamos ao conhecimento de Deus mediante Jesus Cristo, o Senhor, graças à cruz e a sua mediação, confiados nas promessas de sua palavra, pelo poder do Espírito Santo, por meio do exercício pessoal da fé.
Entretanto, a alegria, a bondade, a liberdade de espírito, que constituem as marcas de quem conhece a Deus, são raras em nosso meio — mais raras talvez do que em outros círculos cristãos, onde, se fizermos uma comparação, a verdade do evangelho não é conhecida com tanta clareza e tão completamente. Aqui também pareceria que os últimos poderiam ser os primeiros e os primeiros, os últimos. Um pequeno conhecimento de Deus vale bem mais que um grande conhecimento a respeito dele.
Para salientar melhor este ponto, quero dizer duas coisas:
1. Pode-se saber bastante sobre Deus sem conhecê-lo muito. Tenho a certeza de que muitos de nós nunca pensamos realmente nisto. Descobrimos em nós um profundo interesse pela teologia (que é, por sinal, uma ssunto dos mais fascinantes e intrigantes — no século xvii era o passatempo de todos os cavalheiros). Lemos livros de exposição teológica e apologética; aprofundamo-nos na história cristã e estudamos o credo cristão; aprendemos a descobrir nosso caminho nas Escrituras.
Outros apreciam nosso interesse por essas coisas e somos convidados a dar nossa opinião em público a respeito de diversas questões cristãs, a dirigir grupos de estudo, escrever artigos, fazer conferências e geralmente aceitar responsabilidade, formal ou informal, de agir como mestres e árbitros da ortodoxia em nosso círculo cristão. Nossos amigos nos dizem como apreciam essa contribuição e isso nos leva a explorar mais ainda as verdades de Deus, de modo a podermos atender às exigências que nos fazem.
Tudo isso é muito bom. Entretanto, o interesse em teologia — conhecimento sobre Deus — e a capacidade de pensar com clareza e falar bem sobre temas cristãos não são o mesmo que conhecer a Deus. Podemos saber tanto quanto Calvino a respeito de Deus — na verdade, se estudarmos suas obras com diligência, cedo ou tarde isso vai acontecer —, contudo durante todo o tempo (ao contrário de Calvino) saberemos bem pouco a respeito de Deus.
2. Pode-se saber bastante sobre piedade sem ter muito conhecimento de Deus. Isso depende dos sermões ouvidos, dos livros lidos e do círculo de amigos. Nesta era analítica e tecnológica não faltam livros nas bibliotecas das igrejas, nem sermões nos púlpitos sobre como orar, testemunhar, ler a Bíblia, dar ó dízimo, ser um jovem cristão, ser um velho cristão, ser um cristão feliz, tornar-se consagrado, levar pessoas a Cristo, receber o batismo do Espírito Santo (ou, em alguns casos, como evitar esse batismo), falar em línguas (ou como explicar satisfatoriamente a manifestação do Pentecostes) e geralmente como cumprir todo o programa que os professores em questão associam com a vida do crente. Tampouco faltam biografias narrando as experiências dos cristãos do passado para nosso exame atento e interessado.
Independentemente do que se diga sobre a questão, é certamente possível aprender muito, de segunda mão, sobre a prática cristã. Além disso, se alguém tiver uma boa dose de senso comum pode fazer uso do que aprendeu para ajudar cristãos vacilantes, de temperamento menos estável, a readquirir firmeza e desenvolver o senso analítico quanto a suas dificuldades, ganhando deste modo para si mesmo a reputação de bom pastor. Entretanto, alguém pode ter tudo isso e não conhecer realmente a Deus.
Voltamos, então, ao ponto em que começamos. Não está em jogo a questão de sermos bons em teologia, ou "equilibrados" (palavra horrível e pretensiosa), em nossa abordagem dos problemas da vida cristã. O caso é este: podemos dizer, com simplicidade e franqueza, não porque sentimos ser nosso dever como evangélicos, mas por tratar-se de um fato real, que conhecemos a Deus, e que por esse conhecimento os despra-zeres que tivemos ou os prazeres que não tivemos, pelo fato de sermos cristãos, não nos afetam? Se conhecêssemos realmente a Deus, seria isto o que estaríamos dizendo, e se não o fazemos, significa que precisamos encarar com mais precisão a diferença entre conhecer a Deus e o mero conhecimento sobre ele.
Evidência do conhecimento de Deus
Dissemos que quando um homem conhece a Deus as perdas e as "cruzes" deixam de ter importância; o que ele ganhou simplesmente afasta-lhe da mente essas coisas. Que outros efeitos o conhecimento de Deus produz nos homens? Várias partes das Escrituras respondem a esta pergunta apresentando diferentes pontos de vista, mas talvez a resposta mais clara e direta seja aquela encontrada no livro de Daniel. Podemos resumir esse testemunho em quatro proposições:
1. Os que conhecem a Deus têm grande força por meio dele. Em um dos capítulos proféticos de Daniel lemos: "o povo que conhece ao seu Deus se esforçará e fará proezas" (11:32; arc). A versão revista e atualizada diz: "o povo que conhece ao seu Deus se tornará forte e ativo". No contexto esta definição inicia com "mas" e faz o contraste entre a atividade do "ser desprezível" (v. 21) que estabelecerá o "sacrilégio terrível" e corromperá com palavras suaves e lisonjas aqueles cuja lealdade ao Deus da aliança tenha falhado (v. 31,32). Isto nos mostra que aquele que conhece a Deus toma a atitude de reagir à tendência antideus que vê operando a seu redor. Não consegue descansar enquanto seu Deus é desafiado ou desprezado, sente que precisa fazer alguma coisa. A desonra imposta ao nome de Deus o impele à ação.
É exatamente isso que vemos acontecer nos capítulos de Daniel, onde são narradas as "proezas" do profeta e de seus três amigos. Eram homens que conheciam a Deus e, em conseqüência, sentiam-se compelidos, de tempos em tempos, a posicionar-se ativamente contra as convenções e os preceitos da irreligião e da falsa religião. Daniel, em particular, mostra-se incapaz de relevar esse tipo de situação; sente-se obrigado a desafiá-la abertamente. Em lugar de correr o risco de tornar-se ritualmente impuro ao consumir as iguarias do palácio, ele insiste em uma dieta vegetariana, para grande consternação do chefe dos oficiais da corte (1:8-16).
Quando Dario proibiu, sob pena de morte, que fossem feitas orações durante um mês, Daniel não só continuou orando três vezes ao dia, voltado para Jerusalém, como também o fazia diante de uma janela aberta, de modo que qualquer pessoa pudesse ver o que estava fazendo (6:10). Isto me fez lembrar o bispo Ryle1 inclinando-se para a frente em
1John Charles Ryle (1816-1900), ministro ordenado da Igreja Anglicana, foi indicado em 1880 o primeiro bispo da recém-criada diocese de Liverpool (Inglaterra). Escritor prolífico de livros de caráter devocional, suas obras refletem profunda influência puritana. Era extremamente zeloso pela sã doutrina em uma época em que sua igreja havia posto de lado a própria confissão de fé denominada Trinta e nove artigos de religião.


seu assento na Catedral de São Paulo para que todos pudessem ver que ele não se virava para o leste na hora do credo! Tais gestos não devem ser mal interpretados. Não é que Daniel, ou o bispo Ryle, fossem pessoas desagradáveis ou intratáveis que tivessem prazer na rebelião e só se sentissem felizes se provocassem acintosamente o governo. Significa apenas que quem conhece seu Deus é sensível às situações em que a verdade e a honra de Deus são direta ou tacitamente prejudicadas. Assim, em vez de, por negligência, deixar que tudo continue como está, força a atenção dos homens para o assunto e procura levá-los a mudar de atitude — mesmo que possa sofrer algum risco pessoal.
Essa força por Deus não se resume em atitudes públicas, na realidade também não começa aí. Os homens que conhecem seu Deus são, antes de tudo, homens de oração, e o primeiro ponto em que seu zelo e sua força para a glória de Deus são expressos é nas orações. Em Daniel 9, lemos como o profeta, ao entender "pelas Escrituras" que o tempo do cativeiro de Israel estava chegando ao fim e compreendendo igualmente que o pecado da nação ainda era tal que poderia levar Deus a condená-la em vez de ter misericórdia, decidiu-se a buscar a Deus "com orações e súplicas, em jejum, em pano de
saco e coberto de cinza" (v. 3). Daniel orou pela restauração de Jerusalém com veemência, paixão e agonia de espírito às quais muitos de nós somos completamente estranhos.
Ainda mais, o fruto invariável do verdadeiro conhecimento de Deus é a força para orar pela causa divina — força, na verdade, que só poderá encontrar saída e alívio da tensão interna quando canalizada em tal tipo de oração. Quanto maior o conhecimento, maior a energia! Este pode ser um teste para nós. Talvez não estejamos em posição de realizar atos públicos contra a incredulidade e a apostasia; talvez sejamos velhos ou doentes, ou de algum modo limitados por nossa condição física. Todos, porém, podemos orar a respeito da incredulidade e apostasia que nos rodeia diariamente. Se, entretanto, houver pouca energia nessa oração e, conseqüentemente, pouca prática, é com certeza o sinal de que ainda conhecemos bem pouco nosso Deus.
2. Os que conhecem a Deus pensam grandes coisas sobre ele. Não há espaço suficiente aqui para reunir tudo o que o livro de Daniel nos diz sobre a sabedoria, o poder e a verdade do grande Deus que comanda a história e mostra sua soberania em atos de condenação e misericórdia para com indivíduos e nações, de acordo com sua vontade. É suficiente dizer que não há talvez em toda a Bíblia outra apresentação mais vivida ou firmada dos muitos aspectos da realidade da soberania de Deus.
Em face do poder e do esplendor do Império Babilônico, que engolfou a Palestina, e da perspectiva de outros grandes impérios mundiais que se seguiriam, minimizando Israel segundo qualquer padrão humano de cálculo, o livro todo relembra de forma dramática que o Deus de Israel é Rei dos Reis e Senhor dos Senhores. Lembra também que "os Céus dominam" (4:26); que a mão de Deus está na história em todos os momentos; que a história, na verdade, não é nada mais que "sua história", o desdobramento de seu plano eterno, e que o reino triunfante, no final, será o reino de Deus.
A verdade central — que "o Altíssimo domina sobre os reinos dos homens" (4:25; cf. 5:21) — foi ensinada por Daniel a Nabucodonosor nos capítulos 2 e 4, e também a Belsazar no capítulo 5 (v. 18-23), verdade essa que Nabucodonosor reconheceu no capítulo 4 (v. 34-37) e que Dario confessou no capítulo 6 (v. 25-27). Ela também foi a base para as orações de Daniel nos capítulos 2 e 9 e de sua confiança ao desafiar a autoridade nos capítulos 1 e 6, e de seus amigos, que agiram do mesmo modo no capítulo 3. Essa verdade se constituiu na matéria-prima de toda a revelação que Deus fez a Daniel nos capítulos 2,4,7,8,10,11 e 12.
Deus sabe e prevê todas as coisas, e sua presciência é predestinação. Ele, portanto, terá a última palavra, tanto na história como no destino de cada homem; seu reino e sua justiça finalmente triunfarão, pois nem os homens, nem os anjos poderão opor-se a ele.
Eram esses os pensamentos sobre Deus que tomavam a mente de Daniel, como testemunham suas orações (sempre a melhor evidência da idéia que o homem tem de Deus):
Louvado seja o nome de Deus para todo o sempre; a sabedoria e o poder a ele pertencem. Ele muda as épocas e as estações; destrona reis e os estabelece. Dá sabedoria aos sábios [...] conhece o que jaz nas trevas, e a luz habita com ele" (2:20,21,22). Ó Senhor, Deus grande e temível, que manténs a tua aliança de amor com todos aqueles que te amam e obedecem aos teus mandamentos [...] Senhor, tu és justo [...] O Senhor nosso Deus é misericordioso e perdoador [...] O Senhor, o nosso Deus, é justo em tudo o que faz [...] (9:4,7,9,14).
É assim que pensamos sobre Deus? É essa a idéia de Deus que nossas orações expressam? Será que essa tremenda consciência de siia santa majestade, perfeição moral e graciosa fidelidade nos mantém humildes e dependentes, respeitosos e obedientes, como acontecia com Daniel? Por este teste podemos também medir quanto ou quão pouco conhecemos a Deus.
3. Os que conhecem a Deus são ousados por causa dele. Daniel e seus amigos eram homens que aceitavam riscos. Isso não era temeridade. Eles sabiam o que estavam fazendo, tinham calculado o preço e considerado o perigo. Sabiam qual seria o resultado de suas ações, a menos que Deus misericordiosamente interferisse — o que, por sinal, ele fez. Mas isto não os perturbava. Uma vez convencidos de que sua atitude estava certa e que a lealdade a Deus assim exigia, como disse Oswald Chambers,2 eles "sorridentes lavavam as mãos quanto às conseqüências".
"É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens!", disseram os apóstolos (At 5:29). "Todavia, não me importo, nem considero a minha vida de valor algum para mim mesmo, se tão-somente puder terminar a
2Ministro escocês (1874-1917) que veio à fé pela instrumentalidade das pregações de Charles H. Spurgeon, bastante conhecido por seus escritos devocionais. Sua principal obra é Tudo para ele.


corrida", disse Paulo (At 20:24). Era esse precisamente o espírito de Daniel, Sadraque, Mesaque e Abede-Nego, e é também o espírito de todos os que conhecem a Deus. Ainda que possam achar terrivelmente difícil essa determinação de seguir o caminho certo, uma vez decididos, aceitam-na ousadamente e sem hesitação. Não lhes importa se outros que pertencem ao povo de Deus vejam o assunto de modo diferente e não tomem posição com eles (Sadraque, Mesaque e Abede-Nego foram os únicos judeus que se negaram a adorar a imagem de Nabucodonosor? Nenhuma das palavras ditas por eles e que foram registradas sugerem que soubessem do fato ou que ao menos se importassem com isso. Seu curso de ação estava claro para eles, e isso lhes bastava). Com este teste podemos também medir nosso conhecimento de Deus.
4. Os que conhecem a Deus têm grande alegria nele. Não existe paz comparável à da pessoa que tem a mente imbuída da plena certeza de conhecer a Deus, e de que Deus o conhece. Este relacionamento garante o favor de Deus na vida, na morte e para sempre.
Esta é a paz da qual Paulo fala em Romanos 5:1: "Tendo sido, pois, justificados pela fé, temos paz com Deus, por nosso Senhor Jesus Cristo", e cuja substância ele analisa completamente em Romanos 8:
Portanto, agora já não há condenação para os que estão em Cristo Jesus [...] O próprio Espírito testemunha ao nosso espírito que somos filhos de Deus. Se somos filhos, então somos herdeiros [...] Sabemos que Deus age em todas as coisas para o bem daqueles que o amam [...] aos que justificou, também glorificou [...] Se Deus é por nós, quem será contra nós? [...] Quem fará alguma acusação contra os escolhidos de Deus? [...] Quem nos separará do amor de Cristo? [...] Pois estou convencido de que nem a morte nem vida [...] nem o presente nem o futuro [...] será capaz de nos separar do amor de Deus que está em Cristo Jesus, nosso Senhor (v. 1,16, 17,28,30,31,33,35,38,39).
Esta é a paz que Sadraque, Mesaque e Abede-Nego conheciam; Essa era a razão do contentamento e da calma com que firmaram sua posição diante do ultimato de Nabucodonosor (Dn 3:15): "[...] Mas, se não a adorarem, serão imediatamente atirados numa fornalha em chamas. E que deus pode livrá-los das minhas mãos?".
A resposta deles (3:16-18) é clássica: "Não precisamos defender-nos diante de ti" (Sem medo!). "... o Deus a quem prestamos culto pode livrar-nos, e ele nos livrará das tuas mãos, ó rei" (cortês, mas indiscutível — eles conheciam seu Deus!). "Mas se ele não nos livrar, saiba, ó rei, que não prestaremos culto aos teus deuses" (não importa! Não faz diferença! Vivendo ou morrendo, eles estavam contentes).
As tuas mãos dirigem meu destino,
Ó Deus de amor, bom é que seja assim! Teus são os meus poderes,
Minha vida, em tudo, eterno Pai, dispõe de mim!
Meus dias sejam curtos ou compridos,
Passados em tristeza ou prazer, Em sombra ou luz é tudo como queres,
E é tudo bom, se vem do teu querer.
A extensão de nosso contentamento é outro critério pelo qual podemos julgar se conhecemos a Deus de verdade.
Primeiros passos
Desejamos tal conhecimento de Deus? Então, vejamos duas condições:
Primeiramente, precisamos reconhecer como é pequeno nosso conhecimento sobre Deus. Precisamos aprender a nos medir, não pelo nosso conhecimento de Deus, nem pelos dons e pelas responsabilidades que tenhamos na igreja, mas pelo modo como oramos e por aquilo que vai em nosso coração. Muitos de nós, creio, não têm idéia de quão pobres somos neste sentido. Peçamos que Deus nos mostre isso.
Em segundo lugar, precisamos buscar o Salvador. Quando ele estava na terra convidava os homens a acompanhá-lo; desse modo vinham a conhecê-lo e, conhecendo-o, conheciam o Pai. O Antigo Testamento registra manifestações do Senhor Jesus Cristo antes da encarnação, fazendo o mesmo — acompanhando os homens, como o anjo do Senhor, a fim de que pudessem conhecê-lo. O livro de Daniel conta dois fatos que parecem ser dois desses exemplos — pois quem era o quarto homem que "se parece com um filho dos deuses" (3:25), e passeava com os três amigos de Daniel na fornalha? E quem era o anjo que Deus mandou para fechar a boca dos leões quando Daniel estava na cova dos leões (6:22)? Embora o Senhor Jesus Cristo agora não esteja presente em corpo, espiritualmente isso não faz diferença; ainda podemos encontrar e conhecer a Deus buscando e achando sua companhia. Os que buscarem o Senhor Jesus até encontrá-lo — pois a promessa é que se o buscarmos de todo o coração com certeza o encontraremos — poderão levantar-se diante do mundo para testificar que conhecem a Deus.

O ÚNICO E VERDADEIRO DEUS


o único e verdadeiro Deus

O que a palavra idolatria lhe sugere? Selvagens prostrados diante de um poste-ídolo? Estátuas com faces cruéis nos templos hinduístas? Danças religiosas dos sacerdotes de Baal ao redor do altar levantado por Elias? Tudo isto clara e certamente é idolatria, mas precisamos pensar na existência de formas bem mais sutis de idolatria.
Veja o segundo mandamento. Ele diz "Não farás para ti nenhum ídolo, nenhuma imagem de qualquer coisa no céu, na terra, ou nas águas debaixo da terra. Não te prostrarás diante deles nem lhes prestarás culto, porque eu, o Senhor, o teu Deus, sou Deus zeloso..." (Êx 20:4,5). Sobre o que este mandamento está falando?
Se ele estivesse isolado, seria natural supor sua referência à adoração de imagens de outros deuses além de Jeová — os ídolos da Babilônia, por exemplo, que Isaías ridicularizou (Is 44:9; 46:1), ou o paganismo do mundo greco-romano dos tempos de Paulo, sobre os quais ele escreveu em Romanos 1:23-25: "e trocaram a glória do Deus imortal por imagens feitas segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros, quadrúpedes, e répteis [...] Trocaram a verdade de Deus pela mentira, e adoraram e serviram a coisas e seres criados, em lugar do Criador...".
Em seu contexto, porém, é pouco provável que o segundo mandamento esteja se referindo a este tipo de idolatria, pois se assim fosse só repetiria o pensamento do primeiro mandamento sem lhe acrescentar nada.
Assim, tomamos o segundo mandamento — como tem sido sempre feito — como indicativo do seguinte princípio (citando Charles Hodge): "... a idolatria consiste não só no culto a falsos deuses, mas também no culto ao verdadeiro Deus através de imagens".1
Na aplicação cristã isto quer dizer que não devemos fazer uso na adoração de nenhuma representação visual ou pictó-rica do Deus triúno, nem das pessoas da
Trindade. O mandamento não se refere ao objeto de nossa adoração, mas à maneira como esta é feita; nenhuma estátua ou figura daquele que adoramos deve ser usada como auxílio à adoração.
O PERIGO DAS IMAGENS
À primeira vista parece estranho que tal proibição esteja colocada entre os dez princípios básicos da religião bíblica, pois não vemos, de imediato, muita razão para isso. Que mal pode haver, perguntamos, se o adorador rodear-se de estátuas e quadros se eles o ajudam a elevar o coração a Deus?
Acostumamo-nos a tratar o tema sobre se tais objetos devem ser usados ou não, como uma questão de temperamento e gosto pessoal. Sabemos que muitas pessoas possuem crucifixos e figuras de Cristo no quarto. Dizem que olhar para esses objetos ajuda-as a focalizar os pensamentos em Cristo. Sabemos que muitas pessoas se julgam capazes de adorar com mais liberdade e facilidade em igrejas cheias desses ornamentos que em igrejas sem eles.
Bem, que há de errado nisso? Que mal esses objetos podem causar? Se as pessoas os acham realmente úteis, que mais há para dizer? Que propósito há em proibi-los? Diante dessa perplexidade, alguém poderá sugerir que o segundo mandamento se aplica apenas a representações imorais ou degradantes de Deus, tiradas dos cultos pagãos, e a nada mais. Mas as palavras do mandamento eliminam tal suposição. Deus diz categoricamente: "Não farás para ti nenhum ídolo, nenhuma imagem" para ser usada em adoração.
Essa afirmação categórica proíbe não apenas o uso de figuras e estátuas representando Deus como animal, mas também o uso de figuras e imagens que o representam como a mais elevada criatura que conhecemos — o homem. Proíbe também o uso de figuras e imagens de Jesus Cristo como homem, embora o próprio Jesus tenha sido e permaneça homem. Toda figura ou imagem é necessariamente produzida à "semelhança" do homem ideal, como o imaginamos, e portanto está sob a proibição imposta pelo mandamento.
Ao longo da história, os cristãos têm divergido a respeito da proibição do segundo mandamento, de vetar o uso de figuras de Jesus com propósitos didáticos e instrutivos (por exemplo, na escola dominical). Embora a questão não seja fácil de resolver, não há dúvida de que o segundo mandamento nos obriga a dissociar a adoração tanto pública como particular de qualquer figura ou estátua de Jesus, como de qualquer representação de seu Pai.
Neste caso, que razão há afinal para essa proibição tão ampla? Pela ênfase dada ao próprio mandamento com as assustadoras sanções ligadas a ele (proclamando o zelo de Deus, punindo com severidade os transgressores), supõe-se que deve ser de importância crucial. Mas será realmente?
A resposta é sim. A Bíblia mostra que a glória de Deus e o bem espiritual do homem estão diretamente ligados ao mandamento. Duas linhas de pensamento se nos apresentam e juntas poderão explicar amplamente por que este mandamento deve ser tão enfaticamente destacado. Estas linhas de pensamento não se referem ao auxílio real ou alegado das imagens, mas à verdade delas. São as seguintes:
1. As imagens desonram a Deus, pois obscurecem sua glória. A semelhança das coisas celestes (sol, lua, estrelas), terrestres (homens, animais, pássaros, insetos) e marítimas (peixes, mamíferos, crustáceos) não corresponde exatamente à semelhança de seu Criador. "A verdadeira imagem de Deus", escreveu Calvino, "não é encontrada em nenhuma parte do mundo; conseqüentemente [...] sua glória é profanada, e sua verdade corrompida pela mentira, sempre que ele nos é apresentado de forma visível [...]. Portanto, projetar qualquer imagem de Deus é por si só irreverência, porque mediante essa corrupção sua majestade é adulterada, e ele é representado de modo diferente da realidade".2
O ponto aqui não é apenas que a imagem representa Deus com corpo e membros, o que na realidade ele não tem. Se fosse apenas esta a base da objeção às imagens, as representações de Cristo não seriam erradas, mas a realidade é muito mais profunda. O cerne da objeção às figuras e imagens está no fato de ocultar inevitável e quase totalmente a verdade sobre a natureza pessoal e o caráter do Ser divino representado.
Para ilustrar: Aarão fez um bezerro de ouro (isto é, a imagem de um boi). Com a intenção de manter um símbolo visível de Jeová, o Deus poderoso que havia tirado Israel do Egito. Não há dúvida de que a intenção era honrar a Deus, criando um símbolo de sua grande força.
Entretanto não é difícil ver que esse símbolo é um insulto a Deus, pois que idéia de seu caráter moral, justiça, bondade e paciência poderia ser depreendida da observação de sua imagem retratada por um boi? A imagem de Aarão escondeu a glória de Jeová.
De modo semelhante, as impressões exteriores geradas pelo crucifixo obscu-recem a glória de Cristo, pois ofuscam sua divindade, a vitória na cruz e a realidade do Reino. Ele aponta apenas a fraqueza humana, porém esconde sua
força divina; representa a exatidão da dor, mas não mostra a realidade de sua alegria e força.
Em ambos os casos o símbolo perde valor pelo que deixa de transmitir. O mesmo acontece com as outras representações visuais da divindade.

Não importa o que pensemos a respeito da arte religiosa do ponto de vista cultural, não devemos olhar para as representações divinas à procura de sua glória e de estímulo à adoração, pois na verdade sua glória jamais é encontrada nesses quadros. Por isso Deus acrescentou sobre si no segundo mandamento a referência "zeloso" e vingador de quem não lhe obedece, pois o "ciúme" de Deus, na Bíblia, é seu zelo em manter a própria glória, posta em jogo quando imagens são usadas na adoração.
Em Isaías 40:18, depois de haver declarado vivamente a grandeza incomensurável de Deus, a Escritura pergunta: "Com quem vocês compararão Deus? Como poderão representá-lo?". A indagação não espera resposta, apenas o silêncio reservado. Seu propósito é lembrar o absurdo e a impiedade de pensar que a imagem modelada necessariamente à semelhança de alguma criatura possa ter paridade com o Criador.
Esta não é a única razão pela qual somos proibidos de usar imagens na adoração.
2. As imagens enganam os homens ao projetar idéias falsas a respeito de Deus. A representação inadequada perverte nossos pensamentos sobre Deus e nos incute na mente erros de todos os tipos sobre seu caráter e sua vontade.
Ao representar a imagem de Deus na forma de bezerro, Aarão levou os israelitas a pensar nele como um Ser que podia ser adorado por meio de devassidão frenética. Conseqüentemente, a "festa dedicada ao Senhor" organizada por Aarão (Êx 32:5) transformou-se em orgia vergonhosa. Ainda mais, a história provou com fatos que o uso do crucifixo como auxílio à oração levou o povo a equiparar a devoção com a meditação sobre os sofrimentos corporais de Cristo. Isso os tornou mórbidos em relação ao valor espiritual da dor física, impedindo-os de conhecer o Salvador ressurreto.
Estes exemplos mostram como as imagens falsificaram a verdade divina na mente humana. Do ponto de vista psicológico é correto afirmar que, se os pensamentos estiverem constantemente focalizados na imagem ou figura do ser a quem as orações são dirigidas, você pensará nele e orará a ele conforme a representação da imagem. Assim, neste sentido você estará "se curvando" e "adorando" sua imagem. A medida que essa imagem falha em representar a verdade sobre Deus, você também deixará de adorá-lo em verdade. Esta é a razão pela qual Deus proíbe o uso de imagens e figuras como auxílio à adoração.
Imagens esculpidas e imagens mentais
A compreensão de que imagens e figuras de Deus afetam nossos pensamentos sobre ele sinaliza um campo mais avançado da aplicabilidade da proibição do segundo mandamento. Ele tanto nos proíbe de fazer imagens de Deus como de criá-las mentalmente. Imaginar pode ser uma infração tão real do segundo mandamento quanto idealizá-lo mediante o trabalho manual.
Ouvimos muitas vezes expressões como esta: "Eu gosto de pensar em Deus como o grande Arquiteto (Matemático, Artista)". "Eu não penso em Deus como juiz: gosto depensar nele simplesmente como Pai". Sabemos por experiência como essas expressões servem de prelúdio à negação de algum ensinamento bíblico a respeito de Deus. É necessário afirmar com a maior ênfase possível que quem se considera livre para pensar em Deus como gosta infringe o segundo mandamento. Na melhor das hipóteses, pode pensar em Deus apenas como homem — talvez o homem ideal ou um super-homem —, mas Deus não é igual a nenhum tipo humano. Embora tenhamos sido feitos a sua imagem, não podemos pensar em Deus de acordo com ela. Pensar em Deus desse modo é mostrar ignorância a respeito dele, e não conhecimento.
Toda teologia especulativa, baseada em arrazoados filosóficos e não na revelação bíblica, erra nesse ponto. Paulo nos conta onde termina esse tipo de teologia: "[...] o mundo não o conheceu por meio da sabedoria humana" (1Co 1:21b). Seguir a imaginação de alguém no campo da teologia é o modo de manter-se ignorante a respeito de Deus e tornar-se idólatra — o ídolo neste caso seria a falsa imagem mental de Deus criada pela especulação e imaginação humanas.
Tendo em vista este fato, o propósito positivo do segundo mandamento torna-se claro. Negativamente, é uma exortação à adoração e à prática religiosa que desonram a Deus e falsificam sua verdade. Positivamente, ele nos convoca a reconhecer que Deus, o Criador, é transcendente, misterioso e inescrutável, além do alcance de qualquer conjectura filosófica. Daí a convocação para nos humilharmos, ouvi-lo e aprender dele; assim, ele mesmo nos ensinará como é e como devemos pensar sobre ele.
"Os meus pensamentos não são os pensamentos de vocês", ele nos diz, "nem os seus caminhos são os meus caminhos [...] Assim como os céus são mais altos do que a terra, também os meus caminhos são mais altos do que os seus caminhos, e os meus pensamentos mais altos do que os seus pensamentos" (Is 55:8,9). Paulo fala do mesmo modo: "Ó profundidade da riqueza da sabedoria e do conhecimento de Deus! Quão insondáveis são os seus juízos e inescrutáveis os seus caminhos! Quem conheceu a mente do Senhor?" (Rm 11:33,34).
Deus não é parecido conosco. Sua sabedoria, seus objetivos, sua escala de valores e seu modo de proceder diferem tanto do nosso que não temos possibilidade de comparar nossos caminhos com os dele nem inferi-los pela analogia do homem ideal. Não podemos conhecê-lo a menos que ele se pronuncie e nos fale sobre si mesmo.
Na realidade, ele tem falado. Falou aos profetas e apóstolos — e por meio deles — e tem falado nas palavras e atos de seu Filho. Mediante sua revelação, disponível nas Sagradas Escrituras, podemos formar a noção verdadeira sobre Deus; sem essa revelação jamais conseguiríamos. Parece, portanto, que a força positiva do segundo mandamento está na exigência de formar nossos conceitos so-
bre Deus com base em sua santa Palavra, e em nada mais.
Pelo modo como foi enunciado, parece claro ser este o impulso positivo do mandamento. Tendo proibido a produção e a adoração de imagens, Deus se declarou "zeloso" ao punir não apenas os adoradores de imagens, mas todos os que o "odeiam", isto é, quem desobedece a seus mandamentos de forma geral.
Pelo contexto, seria natural e esperada a ameaça apenas aos idólatras; por que então a ameaça divina é generalizada? Certamente é para percebermos que quem faz imagens e as utiliza na adoração inevitavelmente extrai delas sua teologia, incluindo a negligência de todos os pontos da vontade de Deus revelada.
A mente que admite imagens não aprendeu ainda a amar e a ouvir a Palavra de Deus. Quem espera ser guiado a Deus por imagens feitas pelos homens, materiais ou mentais, por certo não leva a sério como deveria nenhuma parte de sua revelação.
Em Deuteronômio 4, o próprio Moisés interpreta a proibição de imagens na adoração exatamente desse modo, contrapondo a fabricação de imagens à atenção aos mandamentos e à palavra de Deus, como se ambas fossem mutuamente excludentes. Ele lembra ao povo que, embora tivessem visto sinais da presença divina no Sinai, não contemplaram nenhuma representação visível do próprio Deus, apenas ouviram sua palavra. Moisés os exorta a continuar vivendo como se estivessem ao pé da montanha, com a própria palavra de Deus ecoando-lhes nos ouvidos para dirigi-los, e sem nenhuma suposta imagem de Deus para distraí-los.
A idéia é clara. Deus não lhes apresentou nenhum símbolo visível de si mesmo, mas falou com eles; portanto, agora eles não deveriam procurar símbolos visíveis de Deus, mas simplesmente obedecer a sua Palavra. Caso se diga que Moisés estava com medo de que os israelitas tomassem emprestados modelos de imagens das nações idólatras a sua volta, nossa resposta é sem dúvida positiva. Este é exatamente o ponto: todas as imagens de Deus feitas pelos homens, sejam esculpidas ou mentais, são realmente emprestadas do mundo ímpio e pecador, e com certeza não estão de acordo com a santa Palavra do próprio Deus. Fazer uma imagem dele é buscar inspiração em recursos humanos e não em Deus; este é realmente o erro da produção de imagens.
Olhando para o verdadeiro Deus
A questão suscitada por esta linha de pensamento é: Até que ponto estamos guardando o segundo mandamento? Por certo não temos imagens de bezerros em nossas igrejas e talvez nem crucifixos em casa (embora possamos ter alguma figura de Cristo na parede — sobre a qual deveríamos pensar com cuidado redobrado). No entanto, mas temos certeza de que o Deus que adoramos é o Deus da Bíblia, o Jeová triúno? Adoramos o único e verdadeiro Deus? Ou nossa concepção dele demonstra a realidade de não crermos no Deus do cristianismo, mas em outra divindade professada por muçulmanos, judeus ou testemunhas de Jeová?
Você talvez se pergunte: Como posso saber? Bem, o teste é este: O Deus da Bíblia falou através de seu Filho. A luz do conhecimento de sua glória nos é dada na face de Jesus Cristo. Será que olho habitualmente para a pessoa e para a obra do Senhor Jesus Cristo como a revelação da verdade final sobre a natureza e a graça de Deus? Vejo todos os propósitos de Deus centralizados nele?
Se fui capacitado para ver isto e, na mente e no coração, ir até o Calvário e apropriar-me da solução nele encontrada, então posso saber que realmente adoro o Deus verdadeiro, que ele é o meu Deus e que já desfruto a vida eterna de acordo com a definição do próprio Senhor: "Esta é a vida eterna: que te conheçam, o único Deus verdadeiro, e a Jesus Cristo, a quem enviaste" (Jo 17:3).
Nota adicional (1993)
Ao longo dos anos tenho recebido ininterruptamente cartas afirmando que meu argumento sobre o uso de imagens com propósitos devocio-nais ou didáticos foi exagerado. Será?
Três objeções foram levantadas contra ele. Primeira, a adoração a Deus requer tanto a expressão estética mediante artes visuais quanto a expressão moral cristã por meio do amor familiar e do amor ao próximo. Segunda, a imaginação é parte da natureza humana criada por Deus e deve ser santificada e manifestada em vez de estigmatizada e suprimida em nossa comunhão com o Criador. Terceira, imagens (crucifixos, ícones, estátuas, quadros de Jesus) aumentam a devoção, que de outra forma seria enfraquecida.
O princípio da primeira objeção está correto, mas precisa ser aplicado com exatidão. A arte simbólica pode servir à adoração sob várias formas, mas o segundo mandamento proíbe todas as representações da imagem de Deus. Se pinturas, desenhos e estátuas de Jesus — o Filho encarnado — sempre foram considerados símbolos da perfeição humana pelas culturas que os produziram (pele branca para os anglo-saxões, pele negra para os africanos e pele amarela para os asiáticos ou o que quer que seja), em vez da aparência real de Jesus, não haveria problema. Entretanto, crianças e adultos mais simples podem considerá-los reais. Portanto, em minha opinião, seria prudente evitá-los.
O princípio da segunda objeção também está correto, mas a maneira bíblica de aplicá-lo é restringir nossa imaginação visual e verbal à apreciação da história e do maravilhamento diante dos atos divinos. Isso acontece nos Profetas, Salmos e no livro do Apocalipse, que não desafiam o segundo mandamento pela criação de imagens simbólicas ou aparentemente representativas de Deus.
Com relação à terceira objeção, o problema é que tão logo as imagens sejam tratadas como representações e não como símbolos, elas começam a corromper a devoção que pretendiam estimular. Dada a dificuldade de escapar dessa armadilha, a sabedoria aconselha a proceder da forma melhor e mais segura, isto é, não usá-las. Não vale a pena correr alguns riscos.

Tirado do livro: O conhecimento de Deus
AUTOR: J. I. PARKER 

Prestando Reconhecimento aos que Vieram Antes de Nós


Prestando Reconhecimento aos que Vieram Antes de Nós

Durante um banquete, promovido para se premiarem algumas pessoas, o primeiro homenageado levou vários minutos agradecendo às pessoas que o haviam ajudado a conquistar aquele prêmio — professores, sua família, amigos e quatorze colegas que faziam parte de um grupo de artistas a que ele também pertencia.
Quando o segundo vencedor chegou ao pódio para receber seu troféu, seu discurso foi bem resumido:
“Agradeço a vocês pela decisão acertada que tiveram em me premiar.
Quero dizer também que o que fiz, fiz sozinho”.
Claro que ele estava brincando, mas suas palavras nos fazem lembrar muita gente que ocupa posição de liderança atualmente. Se elas conseguem bons resultados e alcançam sucesso, atribuem a si todo o mérito. Mesmo que não o expressem verbalmente, o que pensam é: consegui isso sozinho.
Mas estão enganadas. Nenhum de nós consegue coisa alguma sozinho.
Estamos sempre sendo influenciados e ajudados por outros.

Gigantes do Passado

Sir Isaac Newton disse: “Se vi mais longe do que os outros homens, foi porque estava de pé sobre ombros de gigantes”.

Meus Reconhecimentos
Eu mesmo, por exemplo, conquistei um diploma de doutorado, mas para chegar até esse ponto fui ajudado por muita gente. Primeiro devo minha fé cristã à educação devotada a Deus que minha mãe me transmitiu: minha mãe que orava comigo e por mim, sincera e fervorosamente Aos vinte e um anos emigrei do Egito para Sidney, na Austrália. Não conhecia ninguém lá, a não ser um casal, que, assim mesmo, só conhecia de nome. Mas eu tinha também uma carta de apresentação para o cônego anglicano D.W.B. Robson, que se tornou, depois, arcebispo de Sidney. Foi com seu incentivo e apoio que consegui superar os problemas de não poder comunicar-me bem em inglês. Na verdade, sem seu estímulo, eu não teria conseguido estudar na Escola Teológica Moore.
Houve, também, meu encontro com John Haggai, uma pessoa que acreditou em mim. Convidou-me para dirigir o Instituto Haggai, um ministério de âmbito mundial, com escritórios em seis continentes. Com essa sua iniciativa, Dr. Haggai ajudou-me a atingir, num período de apenas oito anos, o equivalente a cinqüenta anos de maturidade. Com a ajuda de Deus, consegui liderar essa organização.
  Durante todo esse tempo tive uma companheira fiel e dedicada, minha esposa Elizabeth, que me deu amor, apoio e estímulo. Além de ser mãe, fazia também às vezes de pai para nossos quatro filhos, enquanto eu fazia viagens ao estrangeiro, ou ficava até tarde da noite estudando.
Porque estava de pé nos ombros desses “gigantes”, senti que não havia nada que eu não conseguisse fazer. Devo muitíssimo a essas quatro pessoas, e a muitas mais. Jamais poderei esquecer ou negar o impacto que causaram em minha vida e em meu ministério.

Os Precursores Bíblicos

Jesus disse a seus discípulos que os campos estavam prontos para a colheita, usando, obviamente, essa ilustração como símbolo da consagração espiritual. E acrescentou: “O ceifeiro recebe desde já a recompensa e entesoura o seu fruto para vida eterna; e, dessarte se alegram, tanto o semeador como o ceifeiro.
um é o semeador e outro é o que rega. Nem o que planta é alguma cousa, nem o que rega, mas Deus que dá o crescimento. Ora, o que planta e o que rega são um, e cada um receberá o seu galardão, segundo o seu próprio trabalho. Porque de Deus somos cooperadores, lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós.” (1 Co 3.5-9.)
Jesus só deu início a seu próprio ministério depois de João Batista ter-lhe preparado o caminho. Pedro deve seu encontro com Jesus a seu irmão André, que o convidou para também seguir ao Senhor. E o livro de Atos mostra que o martírio de Estevão exerceu uma forte influência sobre Paulo, ajudando a abrir o caminho para sua conversão.

Interdependência

Por que Jesus, após ter treinado seus seguidores, enviou-os de dois em dois, para que o precedessem em cada cidade ou lugar por onde iria passar? (Lc 10.1.) Ter outra pessoa junto certamente encorajaria o viajante em lugares desconhecidos. Mas eu acho que Jesus tinha uma razão adicional para assim proceder.
Quem sabe se Pedro, voltando de uma cidade que visitara sozinho, não poderia dizer: “Olha o que eu fiz!” Será que Jesus não desejava que, desde o princípio, seus seguidores se apercebessem de sua dependência de uns para com os outros — e de sua dependência do Senhor? Pode ser, até, que ele os estivesse preparando para o que é ser “um só corpo em Cristo”. Mais tarde, em suas epístolas, Paulo conclamou, vezes sem conta, a igreja a voltar a essa verdade (Rm 12.3-8; I Co 12.12).
O próprio Jesus poderia ter chamado a si o crédito de tudo que existe, desde a criação até a eternidade. Mas ele respeitou a posição dos fiéis, apontando Abraão, por exemplo, como o pai da nação de Israel (Jo 8.37).
É bem provável que, se algum de nós tivesse vindo como Salvador do mundo, iríamos desacreditar os que nos haviam precedido. Possivelmente diria algo mais ou menos assim: “Moisés era um bom homem, é verdade, mas ele irou-se e desobedeceu. Deus teve que puni-lo. O bom camarada Abraão fez um bocado de coisas ótimas, mas ele tinha seus momentos de fraqueza. Imagina que uma vez ele ficou com tanto medo do faraó que chegou a dizer que Sara era sua irmã! É, mas eu não sou assim, não”.

Como Prestar Reconhecimento a Outros

Se, como líderes, desejamos seguir a Jesus Cristo, devemos, como ele, reconhecer a valor dos outros. Lembremos alguns fatos que podem ajudar-nos a fazê-lo.

1. Todo talento e capacidade são dom de Deus.
 João Batista se expressou muito bem sobre isso: “o homem não pode receber cousa alguma se do céu não lhe for dada”. (Jo 3.27.) Ele sabia que ter vindo como precursor de Jesus não tinha sido iniciativa sua; Deus o tinha dotado para essa missão. Conscientizar-nos de que só temos capacidade de liderança porque Deus no-la deu, torna-nos mais humildes.
Quando o apóstolo Paulo escreveu sobre os dons espirituais (1Co 12), ele usou o mesmo princípio. Não importava quantos dons e talentos os coríntios tivessem, todos eles provinham de Deus. Eles não inventaram dons e nem podiam dotar-se a Si mesmos de dom algum.

2. Não fizemos nada para adquirir nossa capacidade de Liderança.
Ninguém conquista um presente. Quando alguém recebe o dom de liderar, é uma questão de graça e não de mérito.

3. Este presente que nos é dado não deve ser motivo para vanglória.
A uns Deus dá a capacidade para liderar, a outros, a capacidade de reconhecer e seguir os bons líderes. Algumas pessoas têm habilidade com as mãos, outras têm uma facilidade toda especial para falar; outras, ainda, podem pensar mais profundamente que as demais. Mas nenhuma dessas pessoas têm razão para vangloriar-se de ter recebido um dom.

4. Devemos reconhecer e agradecer aqueles que nos ajudaram a desenvolver nossas capacidades.
Os atletas olímpicos têm um talento latente, mas isso não basta. Eles precisam de ajuda, treinamento, correção. Um halterofilista precisa de um instrutor que o ensine a respirar corretamente; um corredor precisa que lhe digam se está correndo com os pés corretamente posicionados, para que não perca segundos preciosos durante a competição.
Com Os líderes acontece a mesma coisa. Sei que eu precisava de ajuda para caminhar. Alguém percebeu em mim traço de liderança e me incentivou; outros me ensinaram lições adicionais.

5. Devemos agradecer a Deus por nossas aptidões.
Já que sei que minha capacidade de liderança não foi criada por mim mesmo, devo regularmente parar e agradecer a Deus por ter-me feito como sou.
Um dos meus amigos, escritor, fez da oração de agradecimento por seus dons uma parte constante de seu devocional diário. Ele ora mais ou menos assim: “Obrigado, Senhor, por ter-me feito um escritor. Ajuda-me a ser o melhor escritor que eu possa ser com o talento que me deste”.
Esse meu amigo sabe que precisa trabalhar para aperfeiçoar seu talento. Quando era pequeno, lia tudo que lhe caía nas mãos. Aos poucos foi aprendendo a distinguir entre a boa e a má literatura, entre a superior e a medíocre. Quando finalmente começou a escrever, tirou proveito das lições que havia aprendido estudando minuciosamente, através dos anos, os escritores clássicos.
Com essa atitude ele agradece tanto a Deus - que lhe deu a aptidão inicial - quanto aos gigantes em cujos ombros se ergue de pé.

Tirado do livro: O estilo de liderança de Jesus 
AUTOR:  MICHAEL YOUSSEF

A Coragem


A Coragem

Maomé tem atualmente milhões de seguidores pelo mundo a fora, e o islamismo é uma das religiões que crescem mais rapidamente.
Logo que começou, entretanto, o número de convertidos era muito pequeno. Quase ninguém entendia o que Maomé estava dizendo. Nos seus escritos ele abriu o coração sobre a bênção que era encontrar alguém que cresse nele. E prometeu para os primeiros adeptos uma infinidade de bênçãos.
Tem surgido um sem número de líderes, religiosos ou seculares, sempre prontos a subornar seus primeiros seguidores. Estou usando a palavra “subornar” aqui no sentido de que eles pagam pela adesão com promessas de bênçãos ou favores, ou tentando convencê-los de que são pessoas especiais. Essa é a maneira mais freqüente para se iniciar qualquer tipo de movimento, negócios ou outras atividades que demandem crescimento numérico. Esses líderes, depois de se empenharem com afinco para conseguirem os primeiros adeptos, estimulam-nos, despertam neles um grande entusiasmo, de modo a fazer com que o movimento se auto-propague.
Mas Jesus não fez grandes promessas quando começou seu ministério.
Segundo a Bíblia, quando chamava seus seguidores, limitava-se a dizer-lhes: “Segue-me” (Jo 1.43).
Mais surpreendente ainda é o fato de que ele não usava qualquer tipo de influência para promover sua causa. João conta a história de Nicodemos chegando à noite para visitar Jesus. Ele descreve Nicodemos como sendo um dos fariseus, “um dos principais dos judeus” (Jo 3.1). Do que ficou escrito podemos inferir que Nicodemos pertencia à hierarquia judaica. Ao mencionar que ele era um fariseu, membro de uma seita religiosa das mais conservadoras, cujo nome significa “aqueles que são separados”, João tenciona chamar a atenção dos leitores para o fato de que aquele homem que estava procurando Jesus não era uma pessoa qualquer.
Imaginem que dividendos renderia tê-lo como um dos primeiros a se converter! Com que orgulho Jesus poderia ter-se jactado: “Tenho discípulos no alto escalão”. Não é estranho que Jesus não tenha dado a Nicodemos uma recepção maior e mais importante do que a qualquer outro? Ele não tentou nenhum tipo de persuasão e nem fez nenhuma promessa; não dispensou, tampouco, palavra alguma de elogio ou que demonstrasse ter reconhecido o “status” daquele homem.
Jesus ouviu as palavras gentis de Nicodemos: “Rabi, sabemos que és Mestre vindo da parte de Deus; porque ninguém pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus não estiver com ele” (Jo 3.2).
Quando Nicodemos parou de falar, Jesus não disse:
“O senhor chegou ao lugar certo. Continue fazendo o melhor que puder”. A presença de um dos grandes de Israel também não intimidou o Senhor. Ele não disse aquilo que muitos dos líderes cristãos atuais dizem quando falam com não-cristãos, principalmente aos que vêm de outras religiões como o budismo, o islamismo, o hinduísmo ou o espiritismo: “Você” conhece uma parte da verdade e nós estamos com a outra parte, e, afinal, estamos todos lutando juntos”.

Jesus olhou de frente para aquele líder religioso, competente e conceituado, e disse-lhe apenas: “É preciso nascer de novo”. Não disse a Nicodemos aquilo que ele queria ouvir, nem o elogiou por ter vindo vê-lo, ou ouvi-lo. Tampouco procurou influenciá-lo para que se tornasse um dos seus discípulos. Em vez disso, transgrediu todas as boas normas de marketing, fazendo a Nicodemos uma exigência espiritual.

Nada de Transigências

De acordo com os padrões de muitos dos líderes atuais, Jesus cometeu um grande erro quando falou com Nicodemos. Qualquer curso de marketing de que já ouvi falar ensina que a primeira coisa que o vendedor tem de fazer é ser agradável com o comprador em perspectiva; é instruído a usar de lisonja ou adulação, a procurar algum ponto positivo ou de interesse do outro, e tecer comentários favoráveis em torno dele. Aprende também a mostrar cordialidade e abertura. E, acima de tudo, deve manter sempre um sorriso.
Muitos líderes, quando diante dos chefões e os poderosos deste mundo, tendem a diluir suas convicções — ou, pelo menos, falar delas com o maior cuidado, enfeitando-as e tornando-as o mais aceitável possível. Evitam ao máximo desapontar as pessoas principalmente no primeiro encontro. Jesus não respeitou essas regras.
A hora escolhida por Nicodemos para encontrar-se com Jesus indica que um homem na sua posição havia de sentir-se envergonhado de ser visto em público com aquele novo rabi controvertido, de nome Jesus. Os fariseus se aproximavam de Jesus de uma maneira condescendente, quase que ostensiva. Nicodemos representa muita gente na nossa sociedade de hoje que julga estar prestando enorme honra ao cristianismo quando declara:
“Nós — autoridades nas letras, árbitros do bom-gosto, representantes da opinião pública, jornalistas, escritores de revistas e outras publicações, comentadores e editores da TV, líderes dos movimentos sociais e filantrópicos — reconhecemos que Jesus foi um grande Mestre”.
Todavia, por mais ostensiva e condescendente que a atitude de Nicodemos tenha sido, a sua percepção mesquinha de quem era Jesus não mudou uma vírgula na atitude de “braços-abertos” do Senhor. Nem deveria a atitude de condescendência de nossa sociedade tornar-nos superiores ou amargos.
Como foi que Jesus conseguiu, ao mesmo tempo confrontar Nicodemos com coragem sem, contudo, deixar de amá-lo? Vamos examinar bem de perto que estilo de liderança Jesus revelou naquela noite.
Na qualidade de um jovem rabi de Nazaré, sem nenhum diploma ou respaldo das autoridades, Jesus se  deparou com uma oportunidade rara de penetrar bem no centro do Sinédrio. Não poderia haver nada mais agradável para um jovem e ardente líder espiritual do que ter, por parte dos homens sábios e influentes, o reconhecimento de ser ele também um mensageiro de Deus. Só depois de anos de ministério, ele poderia vir a receber reconhecimento e elogios a valer, mas não no inicio.
Jesus poderia ter sido absorvido pela lisonja. Poderia ter dito: “Estou honrado com sua presença aqui”, ou então, “é um grande privilégio para mim”, ou, ainda, “estou satisfeito que tenha reconhecido que fui enviado por Deus”. Isso faria muito sentido se o que o jovem rabi estivesse procurando fosse apenas reconhecimento.
Falando da maneira com que falou, Jesus mostrou coragem, audácia e compaixão. Não se preocupou em ir contra o “sistema” e nem ridicularizou Nicodemos. Alguns líderes tentam construir seus impérios rebaixando, ridicularizando, zombando, usando de sarcasmo, mantendo secreta uma grande animosidade. Jesus não usou de nenhum desses recursos.
Aqui Jesus demonstrou que seu estilo de liderança é tão versátil quanto precisa ser para cada ocasião que surge. Quando a multidão estava reunida no templo, Jesus não hesitou em expressar publicamente sua ira para com os vendilhões que haviam profanado a casa do Senhor.
Mas com Nicodemos agiu mansamente. Na quietude da noite não hesitou em manter um debate firme, contudo paciente, com ele.
Não faz muito tempo, assisti pela televisão a um debate entre um líder cristão e um conhecido humanista. Fiquei triste ao ver o líder cristão muito mais empenhado em conquistar a aceitação do público do que apresentar com firmeza as palavras de Cristo. Quanto mais insistentes se tornavam às perguntas do auditório, mais enfraquecida se tornava à mensagem de Cristo por ele transmitida.
A sociedade recebe de braços abertos os elementos da igreja que aceitam sem relutância todos os tipos de crença. Nossa cultura é receptiva aos líderes de igreja que não fazem exigências morais rigorosas. O mundo atual parece sempre disposto a receber uma cristandade sem força moral, irresoluta, que vê Deus em tudo e tudo em Deus. Mas esse não é o estilo de liderança de Jesus.
O estilo de liderança de Jesus exige coragem — para falar a verdade em amor. Há uma diferença entre amor e transigência.
Se alguma coisa aprendemos do estilo de Jesus, é que a verdade vem acima de tudo. Jesus nunca lançou mão de meios escusos para conseguir “vender mais”. Ele não facilitou as coisas com promessas.
Às vezes, chegou mesmo a desencorajar candidatos a segui-lo, mostrando as dificuldades e o preço do discipulado. Não desejava que abraçassem a nova fé ignorando o que o futuro reservava para os seus seguidores.

Os Espinhos da Coragem

Uma amiga nossa trabalhou vinte anos como agente no setor de reserva de passagens de uma das maiores companhias aéreas do mundo. Nos dois últimos anos, por três vezes teve problemas com seus supervisores por causa da sua honestidade.
Como a companhia começou a controlar as chamadas feitas de fora, descobriram que Bárbara tentava passar aos clientes informações completas sobre o serviço e os preços. Se um cliente precisasse voar dentro de determinado horário e a companhia não tivesse nenhum vôo marcado para a ocasião, ela procurava informação com as companhias rivais e a passava ao cliente. Certa feita chegou mesmo a dizer a um dos clientes que, naquele vôo, seria mais econômico para ele viajar por outra companhia.
Bárbara sentia que era preciso demonstrar integridade, embora estivesse também interessada em que sua companhia tivesse lucro. Ela poderia ter perdido o emprego. Mas conseguiu mantê-lo até se aposentar porque a companhia recebia cartas de clientes falando bem a seu respeito. Todos eles faziam questão de agradecer à companhia pela honestidade encorajadora daquela funcionária. Uma das cartas dizia: “Já viajei muito e nunca vi ninguém sugerir outra companhia a não ser que eu insistisse muito. Ela forneceu aquela informação voluntariamente. Quero que os senhores saibam que daqui por diante viajarei exclusivamente pela sua companhia.” Até à aposentadoria continuou ouvindo palavras de desagrado do seu supervisor. Mas ela disse que até preferia ter anotações depreciativas em sua ficha pessoal do que agir desonestamente com as pessoas. Infelizmente, essa companhia aérea não incentivou seus funcionários a seguirem o exemplo de Bárbara — mas permitiu que ela trabalhasse dentro de seu próprio esquema, porque compreendeu que estava sendo beneficiada com isso.
Se esse esquema traz vantagens ou não, o fato é que os verdadeiros líderes têm um posicionamento definido em relação aquilo em que crêem . Esta é a opinião de um líder sobre o assunto: “Se transijo com um princípio para agradar alguém, como é que vou estabelecer os meus padrões”?

A Coragem de Cristo

Em lugar algum da Bíblia vemos Jesus pedir a seus seguidores que tenham uma grande coragem. Em nenhum lugar ele disse: “Jamais transijam com seus valores”. Ele não precisava dizê-lo! Seu exemplo era suficiente.
No segundo capitulo de João, por exemplo, nosso Senhor manteve seu posicionamento contra todos os líderes judeus do seu tempo, porque eles haviam transformado sua casa numa casa comercial. Ele os enxotou com açoites e virou suas mesas. Repreendeu-os duramente por sua corrupção.
Numa ocasião, quando eu estava ensinando sobre esse texto, um jovem promissor aluno, homem de negócios, interrompeu: “Sempre achei isso aí a coisa mais tola do mundo. Ele fez isso, mas no dia seguinte o pessoal voltou, colocou as mesas de volta no lugar e continuou a fazer a mesma coisa”.
Antes que eu pudesse replicar, uma jovem dona-de-casa retrucou: “Às vezes temos que agir simbolicamente. Jesus não podia limpar o templo todos os dias. E nem pretendia fazê-lo. Ele poderia ter passado todo o seu ministério procurando meios de derrubar as mesas e enxotar os vendilhões. Mas ele usou aquela ação como um meio para atingir toda a nação judaica; com aquele ato tão significativo ele mostrou a todos aquilo em que cria e o que ele próprio representava”.
Eu, certamente, não teria tido melhor resposta do que essa.
Não precisamos de mais moralistas na nossa sociedade atual; o mundo está cheio deles. Precisamos, sim, de líderes que nos conduzam corajosamente, que conheçam a verdade e a proclamem sem medo. Não precisamos que nos digam quais são as nossas abnegações; precisamos da coragem de Cristo para fazer aquilo que já sabemos muito bem que devemos fazer.

Coragem na Luta

Certo líder disse: “Os líderes escolhem suas próprias batalhas. Mas não podem vencer todas elas. Estão sujeitos a perder algumas durante a campanha, mas podem vencer a guerra”.
A liderança é, muitas vezes, uma batalha, e a luta requer coragem.
Ter coragem não significa nunca sentir medo ou vacilar; não quer dizer que você nunca vai se sentir confuso, nem perguntar: “Oh Deus! será que é certo o que estou fazendo?” Ter coragem é fazer o que é certo, independente das conseqüências.
Martinho Lutero, o ardente reformador do século XVI, foi um homem de muita coragem. Ele desafiou a igreja daquela época, o papa e outros líderes religiosos e seculares. Em 1521 apareceu diante da Dieta Germânica, na cidade de Worms, e, embora tivesse a promessa de ser protegido, sabia muito bem que estava arriscando a vida. A mesma promessa tinha sido feita a João Huss um século antes, e ele tinha sido queimado na fogueira. Os líderes da igreja prometeram a Lutero perdoá-lo caso se arrependesse dos “erros” e voltasse à “fé verdadeira”. Lutero sabia que essa promessa tinha pouco valor, porque para eles uma promessa feita a um herético não precisava ser cumprida. Ele conhecia a história dos dois séculos anteriores, quando mulheres de cristãos tinham sido torturadas, e muitos outros mortos durante a infame Inquisição Espanhola.
Lutero conseguiu chegar à corte em segurança, mas foi-lhe negada a oportunidade de defender suas teses. Em vez disso, apresentaram-lhe uma lista dos “erros” nelas contidos. Mesmo sabendo que a corte podia decidir sobre sua vida ou morte, quando instado a dizer se se retrataria, sua resposta foi:
“A menos que eu esteja convencido do erro através do testemunho das Escrituras (já que não deposito fé na autoridade insustentável do papa e dos concílios, porque está claro que eles tem errado muitas vezes e que, também, muitas vezes tem entrado em contradição uns com os outros), e com as Escrituras para as quais apelei, não poderei me retratar e nem me retratarei de nada, porque agir contra a própria consciência não é certo, nem nos é permitido.
Por isso mantenho minha posição. Não posso agir de outra forma.
Que Deus me ajude. Amém”.
(T.S. Lindsay, A History of the Reformation, Charles Scribner’s Sons, p.257).

Através dos séculos homens de Deus tem assumido seu posicionamento.
Mantiveram-se firmes em nome da verdade, da integridade e da justiça, qualquer que tenha sido o seu campo do trabalho.

A Coragem em Ação

Alguns anos atrás, havia na Austrália um líder cristão — vamos chamá-lo de Jim — , que trabalhava para o governo. Logo na sua primeira semana do trabalho, seu superior perguntou-lhe se ele gostaria de “fazer umas horas extras”. Como precisasse de dinheiro, Jim disse que sim.
Na primeira noite, seus companheiros sentaram-se a uma mesa para jogar cartas. Quando perguntou pelo trabalho que devia fazer, sou supervisor disso: “Que trabalho? Hora extra é ficar por aqui ‘fazendo cera’ e bater o ponto depois do expediente”.
Jim não se deixou intimidar. Em vez disso, o que fez foi repreendê-lo : “Se estamos sendo pagos para trabalhar, temos de trabalhar”.
Os outros empregados não só se aborreceram com Jim, como até começaram a persegui-lo.
Primeiro impediram que ele fizesse qualquer hora extra; depois, a chefe deu-lhe as piores tarefas. Naquele escritório Jim começou a ficar conhecido por “bíblia”, “pastorzinho”, “fanático” e por mais uma porção de apelidos pejorativos.
Jim se manteve firme. O chefe disse: “Você é um cara legal — esquece esse negócio de lealdade. Faz como os outros e você vai ganhar muito mais dinheiro.”
“Tenho que trabalhar se estou sendo pago para isso. Jogar cartas nas horas de trabalho, quando estamos ganhando extra, não condiz com minhas convicções”.
A situação acabou se tornando insuportável e Jim teve de deixar o trabalho. Antes de sair, o chefe do departamento chamou-o ao escritório e disse-lhe que sua posição tinha mudado a atitude de outros empregados. As pessoas tinham começado a falar em um nível de consciência muito mais alto do que jamais se ouvira naquela empresa.
A coragem de Jim tinha feito dele um líder. Sua recusa em agir como os demais foi honrada por Deus, que desde então o tem abençoado abundantemente, quer no setor financeiro, quer na vida espiritual. Foi o próprio Deus que prometeu: “aos que me honram, honrarei” (1 Sm 2.30).

O Preço da Coragem

Os cristãos que estão em cargos de chefia sabem que um posicionamento definido pode significar prejuízo financeiro, e até mesmo perda de emprego. Os empregadores podem acusá-los de deslealdade.
Mas um líder corajoso sabe que agradar a Deus deve ser a prioridade máxima em sua vida.
O apóstolo Paulo lutou com o problema de agradar a Deus ou conquistar a aprovação dos outros. A epístola aos gálatas mostra isso claramente. Paulo tinha transmitido aos gálatas a mensagem evangélica de que Deus salva através da fé em Cristo — e que isso era tudo. Depois que ele saiu da Galácia, apareceu um grupo de mestres dizendo aos membros da igreja que era preciso que eles cressem em Jesus e se submetessem à circuncisão.
Paulo se lhes opôs: “Absolutamente não!” Ele sabia que aqueles homens estavam ensinando um “evangelho diferente” (Gl 1.6). Insistiu com o povo para não dar ouvidos aqueles cristãos judaizantes e concluiu dizendo:
“Porventura procuro eu agora o favor dos homens, ou o de Deus? Ou procuro agradar os homens? Se agradasse ainda a homens, não seria servo de Cristo” (Gl 1.10).
Essas palavras exigiram coragem. Elas provocaram controvérsia, causaram ira nas pessoas. Paulo provavelmente perdeu um bocado de amigos com esse debate. Mas ele se manteve firme por uma questão de princípio. Hoje podemos nos alegrar porque Paulo tornou clara para sempre que a base da vida de um crente é a fé em Jesus Cristo. Não temos que “completar” nossa fé com práticas do judaísmo, nem precisamos de “Jesus e...”.
Reparem bem no risco dessa atitude corajosa. O bom-senso habitual deveria ter dito a Paulo: “Esse negócio não vai dar certo. Os judaizantes vão ficar tão irritados que acabarão voltando-se contra Jesus. Você tem de falar com eles devagar, com jeito”. Mas Paulo, do mesmo modo que Jesus, não vivia pelos padrões do bom-senso prevalecente. Seu estilo de liderança estava num nível mais elevado.

Nicodemos: O Resto da História
E aquela história do encontro de Nicodemos com Jesus, a que nos referimos antes? Foi corajosa, mas, em ultima análise, surtiu efeito?
Uma passada pelo Evangelho de João mostra que Nicodemos mais tarde fez uma tentativa um tanto fraca de defender Jesus, quando disse aos líderes religiosos que não condenassem Jesus sem submetê-lo a julgamento no tribunal. “Nicodemos, um deles, que antes fora ter com Jesus, perguntou-lhes: Acaso a nossa lei julga um homem, sem primeiro ouvi-lo e saber o que ele fez? Responderam eles: dar-se-á o caso de que também tu és da Galiléia? Examina, e verás que da Galiléia não se levanta profeta”. (Jo 7.50-52.)
Mais tarde, porém, Nicodemos tomou realmente uma posição de coragem. Depois da crucificação de Jesus, o abastado José de Arimatéia pediu a Pilatos permissão para sepultar o Senhor em seu próprio túmulo. E ai aparece na Bíblia a última menção a Nicodemos: “E também Nicodemos, aquele que anteriormente viera ter com Jesus à noite, foi, levando cerca de cem libras de um composto de mirra e aloés” (Jo 19.39). Os dois homens juntos colocaram o corpo de Jesus no túmulo. Com este ato, Nicodemos declarou abertamente que era seu discípulo.
Fora preciso bastante tempo para que Nicodemos admitisse que era seguidor de Jesus. Mas, quando se tornou mais perigoso declarar sua condição de discípulo, ante o evento da cruz, ele encontrou coragem — ou melhor, a corajosa liderança de Jesus contagiou-o.
Parecia que da cruz fluía audácia para Nicodemos; ele ajudou a preparar e sepultar o corpo de Cristo.
Não resta dúvida de que, quando Nicodemos olhou para Jesus na cruz, lembrou-se daquela noite em Jerusalém, quando o Senhor lhe havia dito:
“Assim importa que o Filho do Homem seja levantado” (Jo 3.14).
Talvez fosse aquela lembrança que tivesse varrido toda hesitação e todas as dúvidas da mente de Nicodemos.
Tudo tinha começado quando Jesus mostrou coragem no trato com Nicodemos. E isso também é uma característica do seu estilo de liderança.



Tirado do livro: “O estilo de liderança de Jesus”
AUTOR: Michael Youssef